O metal é um estilo musical caracteristicamente marcado por ter fãs conservadores. Como todo estilo que envelhece, o metal começou como uma forma de expressão de contravenção e peso na Inglaterra e teve excelentes frutos nos anos 1980, com uma aproximação política com o punk, gerando bandas e subestilos cada vez mais criativos e uma produção poderosa de novas bandas. Anos se passaram e, hoje, o estereótipo do fã de metal é o tiozão de motoclube viciado em tocar os mesmos riffs do Metallica em seu nível médio de guitarra, ou o tiozão do Slayer que só essa banda é o verdadeiro metal e nada mais é pesado ou “tr00”. Mas o metal morreu mesmo? Não há reinvenção nesse estilo e estaríamos nós, metalheads, fadados a apenas ouvir Metallica, Slayer, Iron Maiden e Megadeth pela eternidade?
A resposta é: claro que não. E isso depende de sua visão sobre o que é o metal. Se você se encaixa nos estereótipos acima… bem, nada do que será escrito adiante vale para você, já que aqui consideramos o metal como um estilo mais amplo do que o Thrash Metal da Bay Area e bandas inglesas dos anos 1970. O primeiro ponto é que o metal evolui de acordo com a geração. Nos anos 1990, com muita influência e importância de Sepultura e Pantera, tivemos a origem do nu metal e início do metalcore, que tomaram as rádios de rock na primeira década dos anos 2000. Talvez tenha sido o último momento de proeminência do metal nas paradas, momento em que não era raro encontrarmos SlipKnot, System of a Down, Nightwish e Avenged Sevenfold na Billboard 200. E talvez essas tenham sido as últimas grandes bandas do metal para o mainstream, o grande público.
Com a queda das vendas de discos e do rock em geral nas paradas, o metal também se foi esvaindo das paradas. Os motivos são diversos, e não cabe aqui explicitar. Mas podemos citar alguns deles. O primeiro é um conflito geracional de tipos de sons, aprofundado pela queda de jogos como Guitar Hero, que aproximavam essas músicas das novas gerações. O segundo, e para mim um dos piores, é a própria comunidade do metal estar infestada com os estereótipos já citados e cheios de fiscais do “verdadeiro fã” e do “verdadeiro metal”. É um tipo de elitismo — para não falar quando deriva para o machismo, homofobia e racismo — tosco que afasta novos ouvintes. E o terceiro é a própria indústria da música, que vinha impulsionando estilos diferentes dos derivados do rock. Sem falar nas modificações no mercado fonográfico que dificultaram a divulgação do estilo, como a morte de gravadoras, crises de espaço nos meios e modo de consumo de produtos culturais, nesse caso a música.
Ainda assim, o metal sobrevive e revela bandas maravilhosas. A ausência de gravadoras traz um ponto positivo, que é a liberdade de criação e possibilidade de realizar músicas que não sejam necessariamente amigáveis para os ouvintes. Por “amigáveis”, entenda-se como músicas mais curtas, sem muita transição, sem uma sequência de intervalos na composição que sejam mais difíceis de assimilar. Com isso, nos últimos anos, tivemos uma explosão absurda de bandas instrumentais no metal, além de uma evolução na complexidade de composição e produção de bandas com vocalistas que não víamos há muito tempo.
Aqui vamos indicar 5 bandas novas para você checar o que temos de novo e tendência nas novas bandas de metal. São bandas cujo primeiro álbum completo tem até 5 anos de lançado, a partir de 2016. As bandas não estão em nenhuma ordem específica.
1. Tetrarch
O quarteto Tetrarch, de Atlanta, Estados Unidos, tem a história que todo fã de metal gostaria de ter para sua vida. Aos 14 anos, Josh Fore (guitarrista e vocalista) conheceu Diamond Rowe (guitarrista) na escola, onde começaram a trocar ideia sobre bandas de rock que curtiam e, a partir daí, não pararam mais. Em 2007, ainda adolescentes, criaram a Tetrarch, com o objetivo de tocarem guitarra e suas músicas favoritas. Em 2017, 10 anos depois de começarem, lançaram seu primeiro álbum, o Freak, em que a influência do Iowa do SlipKnot é bem notada. E isso é o mais marcante da banda. Uma volta ao nu metal, estilo que marcou época na transição dos anos 1990 para os 2000. Nas músicas do Tetrarch, ficam evidentes as influências do SlipKnot (Pull the Trigger, Oddity, Negative Noise), Korn (I’m Not Right) e Linkin Park do Hybrid Theory (You Never Listen). A banda também conta com o excelente Rúben Limas (bateria) e Ryan Lerner (baixo). Vale ressaltar que Diamond Rowe é uma guitarrista negra e foi a primeira mulher negra a figurar na capa das principais revistas de metal e guitarra, como Metal Hammer, Guitar World e Guitar Player. Um bônus são as postagens de Josh e Diamond no Instagram, que incluem fotos de quando começaram e suas mensagens de amizade. Lançaram dois álbuns: Freak (2017) e Unstable (2021, Napalm Records).
Tetrarch — I’m Not Right
Tetrarch — Negative Noise
2. Spiritbox
Spiritbox é uma banda canadense que não tem nem 1 álbum lançado e já está causando um frisson no mundo do metal. Com os ex-membros da iwrestledabearonce, Courtney LaPlante (vocal) e Mike Stringer (guitarra), Bill Crook (baixo) e Zev Rose (bateria), a banda se encontra em um patamar de metal moderno ainda não muito explorado. E muito disso é por conta da presença (e talento) de Courtney. Spiritbox mistura elementos de metalcore/deathcore — até por conta da banda anterior dos membros — com elementos que presenciamos em bandas como Epica e Within Temptation: deixar um grande espaço para sua vocalista brilhar e ter vocais limpos bem explorados. Essa mistura é muito importante, pois a banda não soa, nos últimos singles, como uma banda de metalcore e tampouco de metal sinfônico, o que lhe dá um aspecto único. Aliás, Courtney é quem grita e canta, e realiza essa transição de modo absurdamente natural. O vídeo da música Rule of Nines se tornou um viral entre os analistas de vocalistas do Youtube, que geralmente ficam chocados com a facilidade de transição. O primeiro CD da banda será lançado pela Rise Records em 2021 e, enquanto isso, ficam os vários singles já lançados desde 2017.
Spiritbox — Circle With Me
Spiritbox — Rule of Nines (Courtney Performance)
3. Termina
Trazendo a junção de memes, Youtube e sucesso nos canais da internet, Termina é o projeto musical do Youtuber Nik Nocturnal e do vocalista Andy Cizek (Monuments). Nik é famoso no Youtube pelo seu jeito debochado de falar de música e metal, satirizando os estereótipos do gênero, mas também é conhecido por ser um ótimo compositor e guitarrista. Já Cizek é conhecido por seus vocais na Monuments, banda de metalcore que já está há um bom tempo no mercado. A ideia do projeto é misturar os elementos do metal moderno em suas músicas e tentar ir um passo à frente ao unificar o elemento de várias bandas, como Architects e Fallujah. Andy realiza os vocais e todo o instrumental é realizado por Nik, basicamente utilizando instrumentos eletrônicos para bateria e baixo. O interessante do projeto aqui é a “nova” forma de composição e produção aplicada no metal e o fato de ser um álbum quase que escrito pela internet, já que os dois estavam distantes em boa parte da elaboração. Outro ponto positivo é que Nik ensina a tocar parte das músicas também em seu canal. O álbum Dysphoria foi lançado em 2021.
Termina — Edge of Time
Termina — The Abyss
4. LANDMVRKS
LANDMVRKS é uma banda francesa de metalcore fortemente influenciada por bandas de pop-punk do início dos anos 2000. Apesar de a descrição lembrar A Day to Remember, LANDMVRKS apresenta outros elementos, além dos refrães grudentos e elementos do pop-punk, como uma grande quantidade de rimas pelo vocalista Florent Salvati. As guitarras de Nicolas Exposito e Paul Wilson trazem o peso quando necessário e os espaços corretos para as partes cantadas. Além disso, especialmente no segundo álbum Fantasy (2018), as guitarras são ainda mais protagonistas do que no terceiro álbum, Lost In The Waves (2021). Rudy Purkart (baixo) e Kevin D’agostino (bateria) completam a banda e mostram como são fundamentais tanto para as partes com grooves e os breakdowns que geram a pancadaria ao vivo. Ainda contam com seu primeiro álbum, Hollow, de 2016. Uma boa pedida para fãs do metalcore tradicional e com ótimos refrães.
LANDMVRKS — Scars
LANDMVRKS — Lost in a wave
5. Slaughter to Prevail
Slaughter to Prevail sem dúvida é a banda mais pesada da nossa lista. Formada em 2014 e com o primeiro álbum de 2017, Misery Sermon, a banda de deathcore é formada pelo vocalista Alex Shikolai, pelo guitarrista Jack Simmons e pelo baterista (ou monstro) Andy Ponddyachy, sendo fruto de trocas de mensagens entre esses membros na internet. Isso porque Jack é britânico e Alex e Andy são russos, o que é muito refletido nas letras, cantadas em russo e inglês, e no visual da banda ao vivo, reencenando estereótipos eslavos de memes na internet (AK47, Ursos, Tanques, Vodka e agasalhos Adidas). Antes que pensem que há um exagero, o clipe mais recente da banda, Baba Yaga, junta TODOS esses elementos. Slaughter to Prevail tem gerado comentários recentemente por conta de seus últimos lançamentos. Demolisher e Baba Yaga combinam um vocal monstruoso de Alex e uma habilidade insana de Andy na bateria, misturando uma velocidade absurda com grooves precisos, que dão forte ritmo na música. As guitarras de Jack trazem também um ponto de melodia que faz com que os refrães, ainda que gritados, fiquem na cabeça e “grudem”. Ouvir Slaughter to Prevail é como estar numa montanha-russa. É assustador num primeiro momento, violento até, mas, quando acaba, você, com seu coração acelerado, pensa: “mas já acabou? Quero mais!”. Ainda que seja uma banda de deathcore, Slaughter conta com muitos elementos que lembram o SlipKnot do primeiro álbum e também com referências a um death metal mais clássico, como Nile. Com essa mistura, Slaughter to Prevail ainda dará muito o que falar.
P.S.: Alex, o vocalista, tem um canal no Youtube com mais de 700 mil inscritos, onde faz covers de músicas famosas com guturais. Também é lá onde saem os clipes da banda.
Slaughter to Prevail — Demolisher
Slaughter to Prevail — Baba Yaga
Conhecia essas bandas? A lista foi curta, mas teremos certamente uma Parte 2. Aqui quis deixar apenas um gostinho do que tem acontecido na cena do metal, apenas para reforçar que o estilo continua evoluindo. O metal não morreu. Se você acha que acabou e que não temos mais bandas como antigamente, quem morreu — por dentro — foi você.
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