Em 20 de junho estreou uma das maiores apostas da Netflix para 2020 entre os dramas asiáticos: o lindíssimo Tudo Bem Não Ser Normal (It’s Okay to Not Be Okay). A resposta positiva foi imediata, e merecida.
O drama acompanha a escritora de livros infantis Ko Mun-Yeong (Seo Ye-Ji), o cuidador Moon Gang-Tae (Kim Soo-Hyun) e seu irmão mais velho Moon Sang-Tae (Oh Jung-Se). Mun-Yeong tem uma espécie de transtorno de personalidade antissocial e seus contos possuem um tom um pouco mais sombrio e diferente do habitual.
Sang-Tae, por sua vez, nasceu no espectro autista e tem alguns traumas de infância, por isso é Gang-Tae quem age “como o irmão mais velho”, sustentando os dois com seu emprego de cuidador em um hospital psiquiátrico. Eles perderam a mãe quando eram crianças, e o irmão mais novo precisou suprimir totalmente suas vontades e sentimentos em prol do mais velho.
O destino dos três se cruza quando Mun-Yeong, de quem Sang-Tae é um grande fã, faz uma leitura no hospital onde Gang-Tae trabalha e acaba se interessando pelo cuidador. Quando ele é transferido para outro hospital, os irmãos precisam se mudar, e acabam voltando à sua cidade natal. A escritora, que, coincidentemente, é natural da mesma cidade, vai atrás deles. Afinal, ela está interessada em Gang-Tae e determinada a conseguir o que quer. Os traumas de infância voltam à tona assim que ela volta ao “castelo amaldiçoado”, como é chamada a casa onde morava com os pais, e ao longo da série os três vão descobrindo como seus passados estão interligados e como podem se ajudar.
Mun-Yeong não tem muitas memórias felizes com os pais. Sua mãe também era uma escritora de sucesso, mas era extremamente abusiva, e o pai, apesar de não ter sido muito presente, também deixou seus traumas. Hoje, a mãe está desaparecida e declarada morta e o pai, que supostamente a teria matado, internado no hospital psiquiátrico onde Gang-Tae trabalha. Os irmãos se estabelecem em um andar da casa de Ju-Ri (Park Kyu-Young, a Ji-Yul de Romance is a Bonus Book), uma amiga que mora com a mãe. As duas também trabalham no hospital.
Sang-Tae desenha e sempre anda para cima e para baixo com seu caderno de desenhos. Com isso, recebe (e aceita) três propostas de trabalho: pintar um mural no hospital a convite do diretor Oh, ilustrar o novo livro de Mun-Yeong e trabalhar na pizzaria do amigo Jae-Su (Kang Ki-doong, o Park Hoon de Romance is a Bonus Book). Mun-Yeong passa a trabalhar como uma espécie de professora de contos de fadas para os pacientes do hospital.
A primeira coisa que chama atenção em Tudo Bem Não Ser Normal é a estética. O clima de “contos de fadas sombrios” vai além das histórias escritas por Mun-Yeong, aparecendo em forma de metáforas, visuais, pequenas animações e outras referências. Em alguns momentos o visual remete aos trabalhos de Tim Burton, mas da melhor forma possível. Os títulos dos episódios são nomes de livros escritos pela personagem ou de contos clássicos, como A Bela e a Fera e Romeu e Julieta, e sempre demonstram grande relação com a história do episódio. A arte belíssima é do ilustrador coreano Jamsan.
No início, não sabemos muito sobre os principais mistérios da série, que vão se revelando aos poucos. Como a mãe dos Moon morreu? O que exatamente Sang-Tae viu? O que significam as borboletas que ele vê em pesadelos? Por que Mun-Yeong tinha uma relação tão abalada com os pais? A mãe dela morreu mesmo? E a primeira dúvida a ser respondida é “eles já se conheciam antes?”, afinal, sabemos bem o quanto os dramas adoram esse recurso narrativo.
À medida que as peças desse quebra-cabeça vão se encaixando e nossas teorias vão sendo ou não confirmadas, fica mais evidente como a narrativa foi bem construída. Tudo já estava lá desde a primeira animação, desde a primeira aparição de alguns personagens.
Cada um dos três protagonistas tem algo que complementa o outro e a história consegue desenvolver essa conexão aos poucos, de forma muito natural. Gang-Tae e Sang-Tae se acostumaram a priorizar um ao outro, sem nunca se aproximar demais de ninguém, e Mun-Yeong está acostumada a conseguir tudo o que quer na hora que quer. Gang-Tae reprime as próprias emoções e a vontade de viver por si mesmo; Sang-Tae não consegue se tornar o adulto responsável que gostaria de ser; e Mun-Yeong camufla sua carência e vulnerabilidade com frieza e um guarda-roupa invejável.
Ela nunca teve uma boa relação com a família, mesmo que o pai ainda esteja, de certa forma, vivo; e os irmãos, que não têm mais ninguém vivo na família, se mudam demais para conseguir criar laços em qualquer lugar. Os três protagonistas estão “sozinhos” no mundo e precisam aprender que os amigos e as pessoas que se importam com você são a família que você escolhe. Seja a mãe de uma amiga antiga, o seu editor ou o irmão do cara que você gosta. Essas relações são construídas e mostradas gradualmente, nas mais variadas formas, de uma sopa de aniversário a uma briga de travesseiros.
Aos poucos, também vamos conhecendo os pacientes do Hospital Psiquiátrico OK, que foram internados lá por situações diversas, desde transtorno de estresse pós-traumático a violência doméstica. Entramos nas mentes desses personagens e somos apresentados aos seus passados, e uma das cenas mais impactantes da série é protagonizada por um deles e por Sang-Tae. Tudo Bem Não Ser Normal tenta, de certa forma, criar empatia e reduzir o estigma da doença mental, ao dar voz a todos esses personagens e tratá-los como iguais — o que não costuma acontecer em outros lugares.
A química do casal principal transborda da tela desde o primeiro episódio, mas não é só por isso que ele é interessante; é principalmente pelo equilíbrio que a relação proporciona aos dois, pois eles são exatamente o que o outro precisa. Com Gang-Tae por perto, Mun-Yeong se sente segura e protegida dos fantasmas do passado, sem precisar simplesmente fingir que está tudo bem, como faz com todo o resto. Já ele começa a perceber que talvez não queira viver apenas para proteger o irmão, e que talvez não seja por causa do irmão que ele vive fugindo. Um passa, sutilmente (ou de maneira nem um pouco sutil, no caso da Mun-Yeong), a questionar e influenciar o outro, fazendo com que alguns sorrisos sinceros comecem a aparecer, para o estranhamento de todos ao redor.
Apesar de a Mun-Yeong e o Gang-Tae serem incríveis, o meu destaque pessoal tem que ficar com o Sang-Tae e o ator Oh Jung-Se. Não existem palavras para descrever a jornada que ele enfrenta e a evolução de seu relacionamento com o irmão e com a amiga/chefe/ídolo. A atuação é impecável e o personagem é precioso demais.
Desde o primeiro episódio, eu soube que Tudo Bem Não Ser Normal tinha potencial para se tornar o meu drama favorito, mas, obviamente, era preciso esperar a conclusão para ter uma confirmação definitiva. Afinal, os dramas costumam mudar bastante a partir da segunda metade, e também existem várias séries cujo último episódio, ou parte dele, consegue estragar ou diminuir toda a experiência. Foi o que aconteceu comigo com o último episódio de How I Met Your Mother e a segunda metade de Something in the Rain. Para muitos também foi o caso do último episódio de Dexter.
Felizmente, além de não ter sido decepcionada, tive todas as minhas expectativas inteiramente superadas — e as minhas teorias foram confirmadas, o que é sempre uma grande satisfação. Tudo Bem Não Ser Normal tomou o posto de Romance is a Bonus Book com folga e muito estilo.
Tudo Bem Não Ser Normal foi exibida entre 20 de junho e 9 de agosto pela tvN, na Coreia, e pela Netflix nos demais países. Todos os 16 episódios de Tudo Bem Não Ser Normal estão disponíveis na Netflix aqui no Brasil, com legendas em português.
Os livros escritos pela protagonista e que aparecem em Tudo Bem Não Ser Normal foram publicados no Brasil pela Intrínseca entre março e junho de 2021. São eles: O menino que se alimentava de pesadelos, Criança zumbi, O cão alegre, A mão e o tamboril e Em busca da feição real.
A editora anunciou a publicação dos títulos como “Coleção It’s Okay to Not Be Okay“. Todos os livros já estão disponíveis e há a opção de comprá-los todos juntos:
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