Naruto é um dos animes e mangás mais aclamados da atualidade. A saga do Ninja que sonha virar o prefeito de sua cidade se tornar o líder de sua vila foi criado por Masashi Kishimoto e publicado pela titânica Weekly Shonen Jump entre 1999 e 2014, tendo seus animes lançados entre 2002 e 2007 (anime clássico) e 2007 e 2017 (Shippuden). Nesse texto eu desejo comentar sobre como foi minha experiência com o Shippuden.
Mesmo se você não tiver o costume ou gosto por anime ou mangá, você já deve ter ouvido falar alguma coisa sobre a saga Naruto. O sucesso que essa história teve lhe rendeu o posto de quarto mangá com maiores vendas da história, com mais de 250 milhões de volumes vendidos, de acordo com a MangaPlus. Além disso, Naruto teve um grande impacto no ocidente, sendo televisionado no Brasil por canais fechados e abertos, tendo seu mangá comercializado e se tornando um produto de consumo em diversos setores: de brinquedos de camelô até mochilas escolares.
A história de Naruto fala sobre a jornada do jovem que dá o nome à obra. Um garoto órfão e desajustado que é rejeitado por todos de sua vila ninja, mas que sonha se tornar o Hokage, o líder e ninja mais forte da comunidade de Konoha. Nessa jornada ele tem que lidar com uma ancestral raposa demoníaca que foi selada dentro de seu corpo, uma fonte de poder e destruição que vive em cabo de guerra com o jovem para se libertar.
Comecei a assistir Naruto com o anime clássico em 2006, entretanto, mesmo o Shippuden tendo sido lançado no ano seguinte, eu só comecei a assistir agora em 2020, pois tinha uma ideia muito forte na mente que era um anime ruim. Não poderia estar mais errado, pois não é um anime ruim. Na verdade, é o completo oposto: eu simplesmente adorei assistir Naruto Shippuden. Não é perfeito, obviamente possuindo muitos erros e coisas que me incomodaram MUITO ao longo da minha experiência, mas deixarei para comentar isso mais para frente.
Naruto Shippuden levanta algumas discussões, intencionais ou não por parte do autor, que me fizeram refletir bastante enquanto assistia. Temas como mitologia e simbolismo japonês, jornada de individuação e a relação privilégios/esforço. Devo informar que a partir de agora irão rolar muitos spoilers pois quero comentar sobre a jornada de individuação e o conflito moderno/tradição que é apresentado na obra.
SPOILERS:
Individuação é um processo psicológico descrito pelo Carl G. Jung que fala sobre uma jornada de transformação pessoal que todos os sujeitos deverão passar ao longo da vida. É um processo em que temos que tomar consciência de todas as forças simbólicas, que ele chama de arquétipos, que existem dentro de nós a nível inconsciente. Para conseguir completar essa jornada, temos que aceitar essas forças em nós, incluindo as mais selvagens e complicadas. Dos arquétipos presentes em nós, o mais selvagem é o arquétipo da Sombra, uma representação psíquica dos impulsos selvagens, incontroláveis, muitas vezes tido como malignos. Explicado isso, voltemos para Naruto.
A raposa demônio, a Kyuubi, representa a Sombra. Naruto vive em conflito com essa sua faceta e o anime o mostra aprendendo a lidar com ela. A sombra nunca pode ser ignorada e a única forma de termos uma relação saudável com a mesma é sabendo o momento de deixar parte dela vir à tona. Em determinada parte do anime, Naruto enfrenta um poderoso inimigo chamado Nagato, onde ele quase liberta totalmente todo o poder de sua Sombra, mas é interrompido pelo espectro de seu falecido pai e ex Hokage, Minato. Ele representaria o Self, a parte mais elevada do psiquismo, onde tudo está integrado e pleno (representando o sonho de Naruto em se tornar o ninja mais poderoso da Vila).
Nessa cena, o vislumbre de seu Self impede que ele se deixe entregar totalmente ao arquétipo da sombra, pois a única forma de o atingirmos (Self) é conseguindo lidar com todos esses conteúdos subjetivos de forma saudável e plena. É com o controle da Kyuubi que Naruto consegue se tornar Hokage, não sendo subjugado por ela. Até o final, o herói aprende a ter uma relação com a sua Sombra, entendendo ela e criando uma relação saudável e até mesmo de amizade com ela.
Outro tema é o conflito geracional, que também se apresenta como o conflito entre passado (tradição) e o futuro (moderno). Esse é um assunto que é super recorrente em animes. Na verdade, me atrevo a afirmar que a dualidade tradição/modernidade é, junto com a explosão das bombas atômicas, um dos temas mais fortes no imaginário japonês, pois sua sociedade é baseada nessa dicotomia: como se modernizar sem perder a essência?
Em Naruto Shippuden, o anime como um todo gira em torno de complexos familiares, principalmente a relação pais-filhos, que muitas vezes é representada na relação aprendiz-sensei. Os principais plots sempre têm algo sobre essa relação, onde o legado ou a carga de gerações passadas está sendo carregado pelos mais jovens. Muito falam também nesse sentido sobre como os mais velhos devem abrir passagem para os mais novos, sobre essa transição de legado, então fica bem forte esse discurso sobre as relações parentais serem nossa base: aqueles que tiverem uma base bem estabelecida conseguem carregar o legado de sua Vila a diante, mas aqueles que tiverem problemas nessa base acabam se “corrompendo”, vide Sasuke, Nagato, Gaara, Kabuto…
FIM DOS SPOILERS
Como falei antes, gostei muito de assistir Naruto Shippuden, porém tiveram muitas coisas que me incomodaram. A quantidade absurda de fillers (e muitos vindo interrompendo momentos decisivos da história), a quantidade de furos na história e a superficialidade da maioria dos personagens são coisas que tão desde o anime clássico, e no Shippuden piora. Entretanto, de tudo que detestei no anime, o pior foi a forma como as personagens femininas foram retratadas: personagens que não foram trabalhadas, não tiveram dimensão, raramente lutam e vivem em razão dos protagonistas masculinos. As únicas exceções a isso foram Konan e Chiyo, e olhe lá.
Eu adorei Naruto. Consegui entender o motivo de ser tão consagrado entre os animes e seu legado vai durar anos (até porque estão lançando o Boruto, o anime com o filho dele). Entretanto, os problemas que citei me incomodaram muito, principalmente no final, onde eles tomam proporções absurdas. Se conseguir ignorar os problemas, você vai amar Naruto e ele vai entrar no seu top animes. Se não conseguir ignorar essas coisas, vai ser um anime bem legal ainda que sinta um pouco de raiva ao longo dele.
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