Era previsível que, depois de terminar Os sete maridos de Evelyn Hugo, eu partisse para mais um livro de Taylor Jenkins Reid. Na verdade, até que demorei alguns meses a mais do que deveria para começar mesmo Daisy Jones & The Six (no Brasil pela Paralela, com o subtítulo “Uma história de amor e música” e tradução de Alexandre Boide). Mas foi difícil demais parar de ler esse livro até acabar e ainda é difícil falar dele alguns meses depois, porque parece que nada vai fazer jus.
Aliás, fica um alerta: fiz o texto sem spoilers além do que já está escrito na maior parte das sinopses, mas a experiência talvez seja melhor sem saber nada que acontece.
São os anos 1970 e Daisy Jones é uma estrela da música em ascensão. Tem algo em Daisy Jones que simplesmente chama a atenção das pessoas, seja seu talento, seu carisma, sua beleza ou o ar de completa loucura que ela emana. Na mesma época, a banda chamada The Six está fazendo seu nome, sob o comando do talentoso e controlador Billy Dunne, que começou a banda junto com seu irmão. Mas o negócio explode mesmo quando um produtor próximo sugere que eles se apresentem juntos e, posteriormente, gravem um álbum juntos, como “Daisy Jones & The Six”.
Nós adoramos gente linda e destruída por dentro. E não dá pra ser mais claramente destruída por dentro e ter uma beleza mais clássica que a de Daisy Jones.
Mas não estamos mais nos anos 1970. Daisy Jones & The Six foram, como bem apostou o amigo produtor, a maior banda do mundo naquela época. E o álbum Aurora foi além das expectativas de qualquer um, até mesmo dele. Só que, misteriosamente, tudo isso só durou um álbum e uma turnê e a banda acabou em seu auge, em julho de 1979. O livro é construído como a transcrição de um documentário, uma compilação de entrevistas e relatos de todos nos dias de hoje, e busca explicar justamente como se deram essa ascensão ao estrelato e esse rompimento brusco.
De certa forma, Daisy Jones & The Six pode ser um oposto de Os sete maridos de Evelyn Hugo: aqui, há vários lados da mesma história, do mesmo dia, do mesmo acontecimento. Muitos personagens falam, não é só uma pessoa no controle da narrativa. Em alguns momentos, as informações de um depoimento contradizem o seguinte — isso é anunciado até no começo da obra, na “nota da autora”, que não é a Taylor Jenkins Reid mas uma autora fictícia mesmo.
O mais assustador era que a única coisa que separava um momento de tranquilidade da maior tragédia da minha vida era uma simples escolha de não fazer aquilo.
Desses vários personagens, há dois que são evidentemente mais importantes: a própria Daisy Jones e o Billy. Billy, que teve problemas com álcool, drogas e perda de controle de modo geral, se casa com a namorada Camila, que sempre o apoiou e acreditou nele, mas que impõe a condição de que fique longe desses problemas. Por ela e pela filha que estão criando, ele se esforça e faz isso. Mas eis que entra Daisy Jones, a própria personificação da perda de controle, o gatilho de tudo que faz mal a Billy. Além de ser uma mulher tão talentosa quanto ele que está, de certa forma, assumindo parte do controle criativo da banda que ele fundou — a Bel Rodrigues fala disso muito melhor que eu neste vídeo.
É lógico que esses dois não vão se dar bem.
Ao mesmo tempo, no entanto, eles brilham mais juntos e são naturalmente atraídos um pelo outro. E não digo exatamente que se sintam atraídos um pelo outro. É mais como uma força da natureza do que algo que eles de fato sintam. O sentimento em si é mais complexo e geralmente o lado negativo acaba pesando mais.
Só que alguém inventou de colocar esses dois juntos encabeçando a composição de um álbum, e a composição é uma coisa extremamente pessoal e profunda para ambos. O que sai é garantia de duas coisas: sucesso e caos.
Todo mundo quer alguém que segure um espelho que mostre a imagem certa de você.
Embora a banda e a cena musical em geral sejam compostas predominantemente por homens brancos, esta é uma história de Taylor Jenkins Reid. Entre os personagens secundários, são as poucas mulheres as personagens que, de fato, movem a história e chamam mais atenção. São elas: Karen, tecladista da banda; Simone, cantora e amiga de Daisy; e Camila, esposa de Billy. Karen é uma mulher cuja prioridade na vida é a música. Ela não quer largar isso por nada nem por ninguém, o que vai contra todas as expectativas dos homens da época. Simone, mulher negra, fazia parte de um grupo de soul antes de cantar disco e foi levemente inspirada em Donna Summer. Camila costuma ser vista como a “voz da razão” e cuida da casa e da filha sozinha durante as turnês da banda. E aí tem Daisy Jones, talentosa, linda e louca.
Eu não tinha o menor interesse em ser a porra da musa de alguém.
Eu não sou a musa.
Eu sou esse alguém.
E assunto encerrado.
Eu gostaria de ter lido Daisy Jones & The Six da mesma forma que li Os sete maridos de Evelyn Hugo, não sozinha. Parece que, novamente, é o tipo de obra que se aproveita melhor compartilhando a leitura com alguém. E é estranhamente difícil explicar esse livro, especialmente sem entregar tudo. Ele suga o leitor e tudo parece muito real, como se as pessoas tivessem mesmo existido. É lógico que a dinâmica da banda e o cenário no qual o livro se passa foram levemente inspirados em bandas que existiram (e existem) de verdade, como o Fleetwood Mac — seu álbum Rumours é a referência mais gritante. Acho que esse livro é uma indicação óbvia e essencial se você for fã de Fleetwood Mac.
Daisy Jones & The Six será adaptado em minissérie de 13 episódios pela Amazon, contando com roteiro de Scott Neustadter e Michael H. Weber. A própria autora é produtora da adaptação, junto com Reese Witherspoon e sua Hello Sunshine. Reese, aliás, foi uma das responsáveis pela explosão de popularidade do livro ao indicá-lo em seu famoso clube de leitura. Vale lembrar que essa combinação já funcionou muito bem com obras como Pequenos Incêndios por Toda Parte, livro de Celeste Ng que foi indicado no clube e virou minissérie produzida e estrelada por Reese.
O que você está esperando para conhecer a maior banda do mundo, Daisy Jones & The Six?
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