Mais uma vez, cá estamos nós para conversar um pouco sobre uma nova temporada de A Maldição, que chegou atraindo diversos olhares curiosos, principalmente depois da relevância que sua primeira temporada teve. E sim, até entendo que essa temporada perca um pouco do terror e parta para uma espécie de romantismo, com ainda mais foco nos traumas dos personagens. Porém, ainda assim, não comparar Residência Hill e Mansão Bly é algo, no mínimo, impossível, visto que se trata de uma mesma antologia e as duas temporadas tratam de assuntos parecidos por meio do terror psicológico.
Vamos lá. Para facilitar e por não conseguir me conter, dividirei este texto em dois blocos: um sem spoilers, contando apenas sobre minha experiência, e um com spoilers, citando algumas cenas específicas. O objetivo de incluir esses spoilers não é estragar a experiência de quem ainda não assistiu, mas sim explicar melhor para quem deseja se aprofundar um pouco mais antes de investir seu tempo.
Primeiramente, essa temporada não foi a mais agradável de assistir, principalmente devido à notável perda de algumas características que fizeram a primeira (A Maldição da Residência Hill) se diferenciar frente a outras séries do mesmo gênero. Desde o início, a temporada tenta (isso mesmo, apenas tenta) nos deixar desconfortáveis, apostando em elementos mais simples e clichês do terror — o que não funciona para a imensa maioria dos espectadores, principalmente aqueles que vieram por influência de sua primeira temporada.
Conhecemos, então, a realidade da Mansão Bly por meio de uma vaga descrição de uma possível história de maldição. Sabemos apenas que envolve uma casa onde os pais de duas crianças morrem em um acidente e, logo depois, também morre uma de suas “tutoras”, na série chamadas de Au Pairs. Após as mortes a vaga se torna difícil de ser preenchida e fica claro que existe algo mais escondido por trás dessa história.
É interessante notar que a história está sendo narrada por outra pessoa, que não sabemos se esteve presente ou se é alheia àqueles acontecimentos. Isso abre brechas para diversos possíveis recursos narrativos que poderiam agregar bastante no desenrolar da trama. Infelizmente nenhum desses recursos é utilizado, com exceção, obviamente, de um possível narrador não-confiável.
Entrando realmente na história, sentimos a primeira tentativa da série de fugir de alguns clichês: a protagonista já se mostra mais esperta do que a maioria dos personagens que encontramos em outros filmes do gênero. Durante sua entrevista de contratação, ela percebe que existem fatos que estão sendo omitidos da história pelo seu contratante, dando uma breve esperança de que talvez possamos esperar mais. De que talvez as atuações e os personagens possam elevar o nível dessa temporada. Porém temos apenas um vislumbre disso, visto que, no decorrer dos próximos episódios, a protagonista passa a agir como qualquer outra personagem de filme de terror.
Após conhecermos alguns dos interesses e um pouco mais dos motivos que levam a protagonista a estar em busca daquele emprego, finalmente ela consegue a vaga e damos então início à história.
Chegando à Mansão Bly, somos apresentados aos demais personagens: o cozinheiro Owen (que, por sinal, é quem traz a protagonista), a governanta Hannah e as crianças Flora e Miles. As crianças acabam sendo, no mínimo, estranhas, nos fazendo questionar se são assim devido aos acontecimentos ou algo do tipo. Inclusive o diálogo e a forma de agir de ambas as crianças acabam sendo expressivos e importantes para o restante da série — o que é legal. Uma pena é ver que também é algo que se perde diversas vezes ao longo da temporada.
A partir daí temos o desenrolar do mistério e vamos nos inserindo cada vez mais na realidade da Mansão Bly. Conhecemos seus segredos e particularidades.
Como disse, uma das coisas que mais enfraquecem essa temporada é apostar em clichês básicos do gênero terror, contradizendo o que já conhecíamos da saga. E temos um claro exemplo disso já nas primeiras cenas da temporada: notamos inicialmente que a protagonista tem algum tipo de problema ou trauma relacionado a espelhos quando ela chega em casa. O problema se dá pela forma expositiva como isso é confirmado. A simbologia de ela manter os espelhos de sua casa cobertos já demonstrava isso e apontava algum tipo de “medo ou incômodo”. Ainda assim, parece que fazem questão de duvidar da inteligência do espectador, adicionando a imagem de um “espírito” no espelho, tentando demonstrar que existe algo mais ali, o que nem sequer assusta.
Por outro lado, algo positivo a se ressaltar é que, assim como vimos na primeira temporada, a série planta brechas e detalhes que vão nos fazendo questionar alguns acontecimentos e até mesmo a própria realidade do que está ocorrendo. Alguns desses mistérios não perduram por muito tempo, novamente sendo estragados pelo excesso de exposição da trama.
Para você que leu até aqui: a temporada é legal, não duvide. Mas também não crie tantas expectativas, pois ela não passa disso. Ela traz uma pegada um pouco mais romântica do terror e pode agradar àqueles que desejam uma obra de terror mais leve e agradável, que vai te prender em curiosidade em alguns momentos e ser maçante em outros. Recomendo sim que assista, principalmente para tirar suas próprias conclusões.
E não se preocupe: se a série não for para você (o que provavelmente ocorrerá com 50% das pessoas que estão lendo este texto), você irá abandoná-la logo no início e buscar outras obras. Caso a série case com seu gosto, você até poderá gostar do resultado final.
(spoilers abaixo)
Agora, adentrando nos spoilers, gostaria de iniciar fazendo uma menção especial justamente ao episódio 8, onde são explicadas as origens de Bly. Pelo início do episódio, ele poderia ter sido o melhor de toda a temporada e demonstrado que sentimentos desejávamos ter, pois em seu início ele traz uma diferença muito grande em relação ao resto da série: a narração muda. Infelizmente ele perde justamente esse seu ponto principal algum tempo depois, e com isso boa parte do charme do episódio também se vai. Caso mantivesse esse diferencial até o fim, teria tido um potencial e poder narrativo muito maiores do que acabou tendo com as palavras ditas.
Mais um ponto interessantíssimo que acaba se perdendo na trama, principalmente pela possibilidade de ter sido algo melhor explorado, é o trauma existente entre a protagonista e seu antigo namorado, algo que praticamente acaba sendo “esquecido” em boa parte da trama. É claro que temos as menções ao fato e os motivos sendo destrinchados, porém novamente as coisas ocorrem de forma um pouco rápida e expositiva demais. Com isso, a possibilidade que a série tem para falar sobre autoconhecimento e sobre as dúvidas que relacionamentos geram, principalmente os primeiros e suas pressões familiares, vai por água abaixo. Felizmente, por outro lado, temos a abordagem de temas mais inesperados e inclusivos na série, como relacionamentos homoafetivos. É uma pena a série não ter se aprofundado mais nisso, pois poderia ter dado mais espaço e episódios para a evolução desse relacionamento.
Apesar das conexões e da lógica criada, o último episódio acaba sendo um pouco maçante e não entrega o real sentido que, aparentemente, deveria ser entregue. Lembra, inclusive, o filme Os Orfãos, recente e inspirado na obra A volta do parafuso, que também peca pela falta de fidelidade e pelo seu final controverso. E sim, sei que até mesmo a obra em livro é controversa em relação a sua narração e final, porém foi uma escolha narrativa do autor que funcionou. Adaptar a obra para outras mídias também traz consigo o desafio de tornar a obra interessante para as mesmas, sabendo medir o equilíbrio entre fidelidade e adaptação narrativa.
Por fim, A Maldição da Mansão Bly deixa claro que, entre uma história de terror ou de amor, estamos acompanhando uma história de amor com alguns poucos relances de terror. O triste, porém, é que nenhum dos dois temas são entregues em 100% ou com uma devida fidelidade. Apesar disso, para aqueles que entenderem, a história traz uma boa moral, explicando que nem todos os fantasmas existentes em nossas vidas são ou serão seres sobrenaturais — às vezes esses fantasmas podem ser apenas resquícios de nosso passado.
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