O ensaio Sejamos todos feministas, de Chimamanda Ngozi Adichie, publicado pela Companhia das Letras, é baseado em uma palestra dada por Chimamanda em um evento da TEDx Talks em 2013. Me interessei pelo ensaio, assim como pela palestra, após a leitura de alguns dos seus outros trabalhos publicados: Hibisco roxo e O perigo de uma histórica única (o qual também é baseado em uma palestra sua).
Chimamanda discorre sobre o feminismo, movimento tão problematizado atualmente, de uma maneira que poucas vezes pude presenciar ser feito: de forma leve e didática. Ao trazer exemplos do cotidiano de modo simples, ela faz com que você sinta de fato a essência do feminismo, o porquê de este fazer-se necessário. E ela faz isso sem entrar em questões superficiais (como depilar-se ou não), as quais fazem com que o movimento feminista seja, muitas vezes, banalizado pela sociedade.
(…) Okolomo olhou para mim e disse: “Sabe de uma coisa? Você é feminista!” Não era um elogio. Percebi pelo tom da voz dele – era como se dissesse: “Você apoia o terrorismo!”.
Ser feminista ainda, mesmo após tanto tempo, é visto como uma prática aterrorizante, um crime perante a sociedade. Afinal, homens e mulheres são diferentes biologicamente. E Chimamanda deixa claro isso no seu ensaio. Entretanto, como ela aborda, não é sobre as diferenças biológicas que o feminismo se debruça, é sobre toda a normativa que o gênero pressupõe. É sobre toda a desigualdade e opressão exercida através e por meio do gênero. Ser feminista é acreditar na igualdade social, política e econômica entre os sexos.
O problema da questão de gênero é que ela prescreve como devemos ser em vez de reconhecer como somos. Seríamos bem mais felizes, mais livres para sermos quem realmente somos, se não tivéssemos o peso das expectativas do gênero.
Chimamanda, ao falar “uma professora universitária nigeriana veio me dizer que o feminismo não fazia parte da nossa cultura, que era antiafricano, e que, se eu me considerava feminista, era porque havia sido corrompida pelos livros ocidentais” me fez lembrar da filósofa Judith Butler. Em seu livro Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade, ela começa a discutir sobre o feminismo e o bombardear de críticas. A que cabe aqui citar é quando Butler aborda que a mulher é atravessada por questões raciais, sociais, classicistas e não apenas patriarcais.
Tendo como base esse pensamento, entendo a professora de Chimamanda ao ter essa ideia sobre o feminismo, uma vez que este se debruça repetidamente em questões que não abarcam a mulher do oriente. A mulher negra. As mulheres em toda sua particularidade. A vivência de uma mulher negra, ou de uma mulher trans, é inegavelmente diferente da de outras mulheres brancas. Não podemos ignorar as outras formas de opressão, que é o que acaba acontecendo ao tentar criar uma ideia universal de “mulher”.
A sensação durante a leitura é de que não há nada mais didático e leve para apresentar o feminismo a alguém que não conhece nada sobre ele a não ser os estereótipos difundidos por toda sociedade sobre o movimento. Chimamanda abusa da simplicidade de uma maneira incrível para explicar como e por que devemos ser todos feministas. Talvez o único defeito da explanação é que esta acaba repentinamente, quando poderia ter muito mais páginas, aprofundar-se mais em algumas questões levantadas rapidamente. Por exemplo, a parte em que ela fala sobre o homem também sofrer, de certo modo, com essa normativa do que é ser “homem” e “mulher”.
No entanto, é compreensível, por ser apenas um ensaio baseado em uma palestra de 30 minutos. Ademais, a forma descontraída escolhida para discorrer sobre o feminismo é cativante, o que faz qualquer pessoa se sentir presa na explicação de Chimamanda. Se um dia quiser apresentar o feminismo para alguém que é leigo sobre o assunto, não recorrerei a Butler, ou até mesmo a Simone de Beauvoir — que possuem uma leitura densa —, mas sim ao ensaio Sejamos todos feministas, porque é uma ótima introdução ao assunto.
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