O filme Ilha do Medo, baseado no livro de mesmo nome de Dennis Lehane, foi lançado em 2010, dirigido por Martin Scorsese e estrelado por grandes nomes como Leonardo DiCaprio (Edward Daniels) e Mark Ruffalo (Chuck Aule). A trama narra a história de Edward “Teddy” Daniels, um agente federal enviado para um manicômio judiciário localizado em uma ilha distante. Durante a viagem, ele conhece seu novo parceiro Chuck Aule, que irá auxiliá-lo na investigação do sumiço repentino de uma das pacientes: Rachel Solando. Além disso, Teddy foi um combatente na Segunda Guerra Mundial e, durante o desenrolar da história, conta que perdeu sua esposa em um incêndio.
Assisti a esse filme por indicação de um amigo e, desde o início do longa, me senti totalmente envolvida na trama. A cada nova cena, diversas perguntas surgiam em minha mente, e, toda vez que eu pensava ter criado uma narrativa lógica para os acontecimentos, surgiam novos eventos que me faziam questionar tudo que havia imaginado ser a resolução do mistério.
Apesar de não ser um filme tão recente, a obra de Scorsese continua sendo um suspense norte-americano aclamado. Isso se dá não somente pela atuação incrível dos atores, pela construção e desenvolvimento magnífico das personagens, mas também pela riqueza de detalhes no enredo da história, inclusive no âmbito imagético da trama. Esse com certeza é um daqueles filmes que você pode ver inúmeras vezes e sempre descobrirá um novo detalhe que deixou passar despercebido.
O diretor faz uso de diversas temáticas referentes ao âmbito da Psicologia e Psiquiatria para construir um cenário em que as personagens, em especial o detetive Teddy, estão sempre em contato com lembranças, sonhos e situações que remetem às diversas violências experienciadas por ele ao longo da vida. São pouco mais de duas horas de cenas intensas, muitos questionamentos e uma reviravolta extremamente marcante ao final.
Em entrevista ao Fantástico, DiCaprio contou sobre as temáticas abordadas no filme e sua relação com o cenário e a intenção do enredo da história:
O filme se passa na ilha do medo, em uma instituição psiquiátrica abandonada. Nós queríamos ter a história da psicanálise, a história de como os pacientes com problemas mentais eram tratados no passado, os métodos cruéis e algumas das técnicas modernas.
(Leonardo DiCaprio)
(A continuação desse texto contém spoilers.)
Ao longo do filme, o “detetive” Teddy revela ao seu parceiro Chuck que está no caso não somente para solucionar o desaparecimento, mas também para encontrar Andrew Laddies. Segundo Teddy, Laddies teria ocasionado o incêndio que assassinou sua esposa e fora internado na instituição. Ao final, e após intensas reviravoltas, descobre-se que Teddy é o próprio Andrew e que este criou um alter ego como forma de fugir da realidade dolorosa em que ele compreende ter matado a própria esposa. Dolores Chanal (interpretada por Michelle Williams) lidava com um transtorno Maníaco-Depressivo e ela própria colocou fogo no apartamento do casal. Por já lidar com os traumas adquiridos no período de combate, recorrendo ao álcool como válvula de escape, Andrew decide se mudar para o interior com sua esposa e seus filhos. Um dia, ao voltar do trabalho, ele encontra seus filhos mortos por afogamento, tendo sido sua esposa a culpada. Abalado, Andrew a mata com um tiro.
A palavra “trauma” vem do grego “ferida”. As feridas podem criar monstros e você está machucado.
Particularmente, considero o fato de Ilha do Medo ser narrado pela perspectiva de Teddy um dos pontos fortes da trama. Somente ao final percebemos como os delírios, as alucinações e a realidade alternativa criada por ele nos fizeram acreditar em uma narrativa completamente diferente daquela que o filme realmente está abordando. Ao entender que o detetive Teddy na verdade é um paciente da instituição e que está internado há dois anos, deixamos de entender o filme como um suspense policial e passamos a vê-lo como um drama. Um drama que escancara a maneira como acontecimentos traumáticos podem levar o indivíduo a uma desorganização psíquica tão grande que, em vez de enfrentar a culpa pelas experiências que vivenciou e pelos atos que cometeu em seu passado, se torna mais fácil construir uma realidade alternativa.
Um aspecto interessante e muitas vezes só percebido após assistir mais de uma vez ao filme são as dicas que são dadas ao longo de todo desenrolar da trama. Ilha do Medo é um filme repleto dessas dicas. Não é à toa que existem muitos vídeos de curiosidades explicando aspectos muitas vezes velados por trás de diversas cenas.
Assim, ao final da trama, entendemos que toda a narrativa criada em torno da investigação do desaparecimento da paciente não passou de uma encenação orquestrada pelos psiquiatras que acompanhavam o caso de Andrew. O objetivo era fazer com ele recobrasse a consciência, para que não fosse necessário submetê-lo à lobotomia cerebral.
O final de Ilha do Medo rende diversas discussões até hoje a respeito da tomada de consciência (ou não) de Andrew sobre tudo que vivenciou e sobre sua verdadeira identidade. Com um enredo genial, atuações impecáveis e um final de tirar o fôlego, Scorsese constrói uma trama envolvente, que coloca o telespectador à mercê das fantasias e delírios de Andrew. Dessa forma, Ilha do Medo vai além de um suspense policial, possibilitando uma análise acerca de temáticas tão caras e necessárias para a sociedade, além de ciências como a Psicologia e a Psiquiatria.
O que é pior: viver como um monstro ou morrer como um homem bom?
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