Eu não sei ao certo o motivo, mas os filmes hispânicos que ascendem mundialmente sempre abordam temas que são considerados tabus, assuntos sensíveis que dificilmente são abordados por Hollywood. Una mujer fantastica é um drama chileno de 2017, dirigido e escrito por Sebastián Lelio. O impacto dessa trama foi tão alto que ele foi o ganhador do Oscar 2018 de melhor filme estrangeiro, desbancando filmes europeus da Alemanha, Suécia e Hungria. Ponto para nós ameríndios.
O drama conta a história de Marina Vidal (Daniela Vega), uma feliz garçonete que vive uma união estável com Orlando, seu esposo, em Santiago del Chile. O casal se ama ardorosamente e fazem muitos planos para o futuro.
As primeiras sequências trabalham para estabelecer a relaxada intimidade do relacionamento do casal: o jantar de aniversário informal em um restaurante chinês; sua dança tenra e a paixão de fazer amor no apartamento de Orlando. Eles estão palpavelmente à vontade na companhia um do outro. Mas a partir do momento em que Orlando sofre um aneurisma aos 12 minutos do filme, tudo muda. Marina, uma mulher trans, é excluída de seus afazeres por sua família e pelas autoridades. Ela não consegue ir ao enterro do seu grande amor, não consegue dar o seu adeus final e é rechaçada pela família do seu marido, que a chama das palavras de mais baixo calão – chegando até a agredi-la.
Tanto a narrativa quanto o trabalho de câmera procuram indicar a dor de Marina: quando ela abre o guarda-roupa de Orlando, ela enterra a cabeça em suas roupas para absorver seu perfume; enquanto dirige, o foco no banco do carro vazio onde ele uma vez sentou fisicamente a ausência em sua vida. Lelio também rompe o verniz realista do filme mostrando como Orlando continua a assombrar as atividades cotidianas de Marina: vemos seu reflexo nos óculos de sol; sentado no banco de trás do carro, ou no meio da multidão, numa barulhenta discoteca; ou guiando-a para o crematório para se despedir de seu cadáver. O vazio é muito tangível. A ex-mulher de Orlando, Sonia (Aline Küppenheim) pode ver a relação de Marina e Orlando como perversa – referindo-se a ela como uma novela, que ela contrasta com seu próprio passado “normal” com ele – mas a peça com autenticidade e realidade enfraquece qualquer ideia fixa sobre o que constitui o normal ou o natural.
Uma mulher fantástica é, em muitos aspectos, um conto de sobrevivência emocional na sequência do abuso verbal, físico e psicológico. Atormentada, ostracizada e até criminalizada, Marina é levada a se sentir um pária social, por tudo e todos ao seu redor.
Bem mais que tudo isso que eu falei acima, Una Mujer Fantastica é um drama que abruptamente prende a atenção do telespectador e que une ferozmente o contemporâneo e o preconceito ainda existente na sociedade. E o questionamento da sétima arte ao filho de Orlando me vem à cabeça e eu o faço a vocês: e se Orlando fosse seu pai separado e Marina Vidal sua madrasta? Você estaria pronto para lidar com o novo, ou seria mais um dos que com certeza você julgou no filme por violentaram Marina?
Mi nombre es Marina Vidal, ¿tiene algún problema con eso?
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