Entre agosto e novembro de 2018, meses antes de todo o rebuliço da turnê Nossa História, com quatro datas no Allianz Parque esgotadas e eu passando horas em filas online sem conseguir ingresso para nenhuma delas, Sandy lançou seu terceiro álbum solo de estúdio (depois de Manuscrito, de 2010, e Sim, de 2013). O título Nós, Voz, Eles é um trocadilho que só podia mesmo ser de um projeto da Sandy e que diz tudo sobre o que esperar do álbum. A cantora e compositora, e seu marido, o multi-instrumentista e produtor Lucas Lima, compuseram as versões iniciais das faixas juntos, convidaram artistas que admiram para colaborações, gravaram e produziram tudo juntos no estúdio que têm em casa. Para completar, o processo inteiro foi documentado em uma websérie de 8 episódios no Youtube:
Ao longo da carreira solo, Sandy foi encontrando seu nicho e sua própria identidade na música após a parceria com o irmão, participando mais da composição e produção com o passar do tempo. Eu sinto como se cada álbum fosse amadurecendo o som do anterior, e em algum ponto realmente achei que não pudesse ficar melhor que o Sim. Felizmente, me enganei: Nós, Voz, Eles é a consolidação de tudo isso e da artista que ela é hoje.
É uma bela dose de música pop (porém, ilustrando com Taylor Swift, é um pop muito mais Red que reputation, como já seria de se esperar) com pitadas de folk, blues e jazz, além de produção e composição impecáveis. Sandy e Lucas são os melhores parceiros um do outro (sem diminuir de forma alguma o Junior e a Família Lima), e cada coisa que fazem juntos parece estar um degrau acima da anterior. “Me Espera”, que já é uma obra de arte, é completamente passada para trás:
Cada colaborador parece ter sido escolhido a dedo. É a impressão que você tem ouvindo a unidade do álbum, e ela se confirma ao ver os episódios da websérie. Vou até fazer uma pausa para comentar sobre a websérie: é algo que vai deixar feliz qualquer pessoa que ame música e que ame reuniões de amigos. Afinal, é justamente sobre receber os amigos e pessoas que você admira em casa e fazer música, sempre acompanhados de um chimarrão, chá, vinho… ou pinga mesmo. Talvez os nerds mais desavisados fiquem impressionados ao ver a quantidade de referências a fantasia, clássicos do cinema e games no estúdio que Sandy e Lucas têm em casa. No meu caso, eu já sabia que me identificaria com eles quando ele e ela mostraram no Twitter que amavam Scott Pilgrim vs. the World, meu filme favorito.
A sonoridade do álbum é bem coesa e, ao mesmo tempo, as músicas individuais se encaixam na identidade dos artistas que fazem participações especiais. São eles: Maria Gadu (“No Escuro”), o próprio Lucas Lima (“Areia”), Mateus Asato (“Grito Mudo”), Anavitória (“Pra Me Refazer”), Thiaguinho (“Um Dia Bom, Um Dia Besta”), Melim (“Eu Pra Você”), Xororó (“Meu Disfarce”) e Iza (“Eu Só Preciso Ser”).
Gadu e Iza participam das duas faixas mais influenciadas por blues e jazz. As mais felizinhas para levantar seu dia ficam no meio, com participações de Thiaguinho e do trio Melim, e Lucas e Anavitória aparecem em um som mais familiar em relação aos trabalhos anteriores da Sandy, mais puxado para o folk. A parceria com Asato, guitarrista mais seguido no mundo, é um pouco diferente, mas funciona. Tem um quê da música de John Mayer e Orianthi. Já Xororó participa da única faixa não-inédita: Sandy escolheu uma música já gravada na década de 80 pela dupla Chitãozinho & Xororó, uma de suas favoritas da carreira do pai, para ganhar uma espécie de repaginada na nova parceria.
É até difícil separar algo com destaque em um álbum de apenas oito músicas, mas talvez a de Iza seja a que brilha mais entre as oito. Eu poderia dizer que é porque as vozes delas combinam perfeitamente, mas a sintonia existe em todas as outras colaborações também. Poderia dizer que é porque a produção é impecável, mas isso se aplica a todas as outras faixas também. Mas algumas coisas nela simplesmente se destacam, especialmente ouvindo como mulher nos dias de hoje… e a mensagem é clara e direta: “eu só preciso ser”.
Para ouvir o álbum inteiro:
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