Com um nome peculiar e um casal de covinhas, o k-drama Hometown Cha-Cha-Cha é uma espécie de nova versão do filme Mr. Hong (2004) e uma das grandes apostas da tvN e da Netflix em 2021.
Hong Du-sik (Kim Seon-ho) é o faz-tudo oficial da pequena cidade de Gongjin e conhecido como Chefe Hong. Yoon Hye-jin (Shin Min-ah) é uma dentista competente e um pouco metida que mora em Seul. Após uma briga que a fez perder seu emprego, ela vai visitar Gongjin, lugar que sua falecida mãe adorava, e algumas reviravoltas fazem com que ela decida se mudar para lá. Já nessa primeira visita, acaba esbarrando várias vezes com o Chefe Hong, precisando de seus serviços e de sua ajuda, mas os dois só se desentendem.
Inicialmente, parece que ela nunca vai se adaptar à cidade, que nunca será acolhida ali e que os dois protagonistas nunca vão se entender. É uma vida completamente diferente da qual ela está acostumada, bem mais devagar e simples, e é preciso entender o valor que há nisso para ter uma chance de dar certo. E é isso que vai acontecendo aos poucos, quando esses dois opostos vão se tornando amigos.
No meio disso tudo, surge em Gongjin o diretor Ji Seong-hyeon (Lee Sang-yi), amigo de faculdade de Hye-jin. Embora ele e Du-sik desenvolvam uma espécie de rivalidade, tanto para ser a pessoa a quem todos da cidade pedem ajuda quanto pelo coração de Hye-jin, os dois se conhecem por acaso e se tornam amigos rapidamente. Eles cuidam um do outro e de fato se importam, antes mesmo de se darem conta de seus interesses amorosos, o que torna a rivalidade apenas um alívio cômico na amizade. A dinâmica entre o trio de protagonistas é excelente e refrescante — tornando Hometown Cha-Cha-Cha mais um exemplo de drama que se afasta de estereótipos ultrapassados e tóxicos.
Como não vi o filme Mr. Hong (2004), que deu origem ao drama, não posso dizer como a adaptação se compara. Mas os fãs da série americana Hart of Dixie (2011-2015) se sentirão em casa. A relação de Du-sik e Hye-jin é cheia de implicância e dos conhecidos conflitos entre a médica da cidade grande e um homem de camisa xadrez que prefere levar a vida de forma mais leve. Também indicado para fãs de dramas como: Fight for my Way (2017), Para Sempre Camélia (2019) e Pousando no Amor (2019-2020). O inverso também vale, então pode emendar em qualquer um desses quando acabar de ver Hometown Cha-Cha-Cha.
Outro fator importante para investir em Hometown Cha-Cha-Cha é que já conhecemos o elenco. Seon-ho foi o interesse amoroso secundário de Apostando Alto, que causou revolta nos quatro cantos do mundo em 2020. Min-ah foi a protagonista de Tomorrow, With You em 2017. E Sang-yi está em todo lugar em 2021, chamando atenção particularmente no triste Youth of May. Bônus: Kim Gam-ri, a idosa mais fofa e amada de Gongjin, é interpretada pela Kim Young-ok, mãe do protagonista de Round 6.
Somos apresentados a Gongjin como um lugar peculiar, mas ao mesmo tempo uma típica cidade pequena. Acolhedora, unida, um pouco esquisita e cheia de acontecimentos engraçados e inusitados. Podemos até dizer caótica. Conhecemos Du-sik como alguém sempre presente para todos em todos os lugares, mas ao mesmo tempo muito reservado. Sua vida profissional é um ótimo paralelo a isso: vive muito bem de “bicos”, mas não tem vínculo com ninguém. E Hye-jin é exigente, dedicada, honesta em todos os sentidos, mas também um pouco metida. Se importa muito com sua imagem e com as coisas estarem ao seu gosto. Talvez seja um reflexo dos círculos nos quais convivia em Seul, sempre prontos para julgamentos negativos.
Ao abrir sua clínica, Hye-jin até leva a melhor amiga, Pyo Mi-seon (Gong Min-jung), para trabalhar com ela como recepcionista. Assim, se sentiria menos sozinha. As duas inclusive passam a dividir a casa. E Mi-seon é bem mais aberta às outras pessoas e às peculiaridades locais, então logo se torna, junto com Du-sik, a conexão oficial de Hye-jin com a cidade — seja para a clínica ter clientes ou para estar por dentro das fofocas.
E a fofoca mais importante é que a cidade de Gongjin tem três mistérios. O primeiro é o que aconteceu nos cinco anos depois que Du-sik se formou da faculdade em Seul. Ele passou esse tempo por lá antes de voltar a Gongjin, mas esconde para si o que aconteceu na época. O segundo é por que Yeo Hwa-jeong (Lee Bong-ryun) e Jang Yeong-guk (In Gyo-jin) se divorciaram. A comerciante e o chefe do distrito foram casados por um tempo e têm um filho, mas ela pediu o divórcio e ninguém sabe o porquê. E o terceiro é quem é o vencedor da loteria. Há três anos, um habitante de Gongjin acertou os números da loteria e ganhou um prêmio de 1,4 bilhões de won (cerca de R$6 milhões), mas a pessoa nunca se revelou.
Esses mistérios são revelados aos poucos, particularmente na segunda metade da história. Hometown Cha-Cha-Cha incorpora muitos elementos de “destino” e momentos em que o passado dos protagonistas se entrelaça — tanto no casal principal quanto até com o Seong-hyeon. Há vários flashbacks, inicialmente mais curtos, depois mais longos, que contribuem para mostrar isso e para criar certas teorias quanto aos famosos mistérios da cidade.
Pode-se dizer que Hometown Cha-Cha-Cha era parte da minha dose de felicidade semanal (junto, mais recentemente, com Yumi’s Cells e Dali and the Cocky Prince). É, afinal, uma história leve centrada em uma pessoa se adaptando a uma grande mudança de vida e em outra pessoa aprendendo a se abrir. Se passa em uma cidade pequena e peculiar à beira-mar, quase como se a Stars Hollow de Gilmore Girls ficasse na praia. A própria trilha sonora incorpora esse clima.
É muito, muito divertido acompanhar a história de Hye-jin, Du-sik e todos ao redor deles. Os personagens secundários têm seus próprios arcos, que são interessantes e bem-desenvolvidos, e parecem pessoas de verdade. Alguns são mais chocantes, outros são mais tristes, e outros mais cômicos. Mas todos têm seus arcos. Para produções sul-coreanas, onde é difícil existir, por exemplo, representatividade LGBTQIA+, aqui há um pequeno avanço em um arco tratado com leveza e respeito.
E, embora discutam muito e tenham sua própria bagagem, os dois protagonistas parecem se tratar com respeito e maturidade na maior parte do tempo — especialmente depois de o relacionamento começar. Parece que nem eram tão opostos assim, no fim das contas.
Mas, pelos episódios finais, uma mensagem se destaca: a de que a vida é curta demais. Curta demais para não aproveitar, curta demais para não ser sincero com seus sentimentos, curta demais para não dar o seu melhor, curta demais para não abraçar quem ama, curta demais para não pedir desculpas, curta demais para não se cuidar, curta demais para não se conectar com as pessoas ao seu redor. Podemos ver isso aos poucos em todos os personagens, assim como podemos ver um reflexo da nossa dificuldade absurda de lidar com a morte. Não importa quanto tempo você tenha — e é imprevisível quanto tempo realmente temos —, sempre será pouco. Du-sik, especificamente, foi alguém que sempre lidou com muita perda e teve que encará-la de modo muito brutal em diversos momentos da vida. Isso quase o quebrou, mais de uma vez, embora tenha guardado muito para si. Mas ele continua vivo, e vivendo.
E é até estranho, para uma história predominantemente tão leve, que Hometown Cha-Cha-Cha tenha tantos momentos de partir o coração. Funciona. Dá vontade de correr para abraçar os pais e viajar o mundo no segundo seguinte. Só não era o que eu esperava. Não esperava, antes do inevitável final feliz e engraçado de doer as bochechas, chorar tanto.
Dizem por aí que, quando você perde alguém que ama, deve viver o luto. Se não fizer isso, o luto se espalha por todo o seu corpo e explode depois.
Hometown Cha-Cha-Cha foi exibido entre 28 de agosto e 17 de outubro de 2021 na Netflix da maioria dos países. São 16 episódios de cerca de 1h20 cada um. No Brasil, a Netflix disponibiliza dois episódios por semana, aos sábados, desde 9 de outubro — sempre com legendas e dublagem em português. Os episódios finais devem ir ao ar em 27 de novembro.
Embora cada episódio seja quase do tamanho de um filme, o tempo voou vendo Hometown Cha-Cha-Cha. Cumpriu tudo o que as expectativas prometeram e tem tudo para ser um dos melhores do ano. Talvez com um pouquinho mais de reflexão e lágrimas do que o esperado, o que não é nenhum demérito, mas com garantia de muitas risadas pelo caminho e uma história leve e aconchegante.
PS: Sobre a questão de Seon-ho.
Depois de finalizar o texto e o drama, dei de cara com alguns rumores e notícias sobre o protagonista, Seon-ho. Isso não tem como afetar a minha experiência pessoal com o drama, os personagens e a história, que recomendo de olhos fechados, porque vi as notícias depois. Por isso vai ser um “adendo” ao texto. Mas não podia deixar passar em branco, então vamos lá.
Uma publicação online que saiu pouco após o final de Hometown Cha-Cha-Cha denunciava comportamento abusivo de um “ator K”. É um relato de uma ex-namorada, que expõe tanto os abusos dentro de seu relacionamento quanto o comportamento escroto genérico do ator, que ridicularizava colegas de elenco e afins. A ex-parceira relata até que ele a manipulou a realizar um aborto na época, insinuando que se casaria com ela caso o fizesse e sumindo depois. O relato é bem pesado. Não foram citados nomes, e parte da internet até supôs que não seria Seon-ho pela descrição de ser um “astro em ascensão”, mas outras fontes tinham certeza. Sua agência declarou que estava “investigando”.
A confirmação parece ter vindo do próprio Seon-ho, que divulgou um depoimento de “desculpas”. Aliás, o depoimento não diz grandes coisas além de que ele realmente namorou a pessoa, que a machucou com sua “falta de consideração” e que, segundo ele, ainda não houve “oportunidade” de pedir desculpas pessoalmente. Realmente, ele repete o pedido de desculpas várias vezes no depoimento, mas fora isso foi uma nota bem rasa para a seriedade das denúncias. Enquanto isso, o ator já perdeu parcerias com marcas e também a vaga no elenco fixo de um programa de variedades.
Pouco após a divulgação da nota, a ex-namorada em questão também se pronunciou mais uma vez, parecendo um pouco assustada com a proporção que as coisas tomaram. Ela também pediu desculpas, frisou que não pretende fazê-lo “desabar”, não se sente bem com isso e eles precisam conversar. Ainda não sabemos se esse é o fim da história.
Se essa situação toda deixa você desconfortável em ver/apoiar o drama ou se você vai ver mesmo assim, só você pode saber — e cabe a você decidir.
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